O Plenário do Tribunal de Contas dos Municípios do Pará (TCMPA) aprovou voto-resposta da conselheira Mara Lúcia Barbalho à consulta feita pela Prefeitura de Bom Jesus do Tocantins sobre se é possível ao chefe do Poder Executivo Municipal realizar, mediante decreto, a extinção de funções ou cargos públicos que não se encontram vagos, bem como se é inconstitucional projeto de lei municipal que visa extinguir funções e cargos públicos que não estejam vagos, e, em decorrência dessa extinção, realizar o reaproveitamento de servidores em função ou cargo público com nível de escolaridade superior ao cargo extinto.
Quanto ao primeiro questionamento, a conselheira Mara Lúcia esclarece que, com base no art. 54, I, da LOM, que estipula que a iniciativa dos projetos de lei dispondo sobre a estruturação e atribuições dos órgãos da administração pública é privativa do prefeito, não há óbice quanto à iniciativa de projetos de lei que disponham sobre a estruturação e atribuições dos órgãos da administração pública, pois a competência está devidamente observada: a iniciativa é privativa do prefeito.
Quanto ao segundo questionamento, o Tribunal considera inconstitucional o projeto de lei municipal que visa extinguir funções e cargos públicos que não estejam vagos, e, em decorrência da extinção realizar o reaproveitamento de servidores em função ou cargo público com nível de escolaridade superior ao cargo extinto.
A decisão foi tomada durante a 1ª Sessão Extraordinária do Pleno, realizada nesta quinta-feira (18), sob a condução do conselheiro Antonio José Guimarães, presidente da Corte de Contas, e do conselheiro Lúcio Vale, vice-presidente do TCMPA.
CONFIRA O VOTO
A conselheira Mara Lúcia enviou a consulta para a Diretoria Jurídica (DIJUR), que em preliminar análise, solicitou o apoio técnico do Núcleo de Atos de Pessoal (NAP). Em seguida foi elaborado o Parecer nº 512/2023/DIJUR/TCMPA, que passou a integrar o relatório e voto da relatora, publicado a seguir, na íntegra, para melhor entendimento:
“NO MÉRITO, verificado o detalhamento e específico cotejamento da matéria com
as previsões constitucionais e legais vigentes, traçados com profundidade e correição pelo Núcleo de Atos de Pessoal do Tribunal e consolidados e ratificados por nossa Diretoria Jurídica, tal como integralmente transcritos em relatório, cumpre-me, tão somente, aderir ao posicionamento estabelecido, traçando os seguintes pontos de resposta ao quesito formulado:
a) É possível ao Chefe do Poder Executivo Municipal, realizar mediante Decreto, a extinção de funções ou cargos públicos que não se encontram vagos?
Necessário trazer à baila, as disposições fixadas no âmbito do próprio ente Consulente, o qual merece destaque o disposto no art. 15, II da Lei Orgânica do Município de Bom Jesus do Tocantins:
Art. 15. Compete privativamente ao Município:
II- legislar sobre assuntos de interesse local
Na esteira desse raciocínio, considerando que o art. 54, I, da LOM estipula que a iniciativa dos Projetos de Lei que disponham sobre a estruturação e atribuições dos Órgãos da Administração Pública é privativa do Prefeito, verificamos que não há óbice quanto à iniciativa de Projetos de Lei que disponham sobre a estruturação e atribuições dos Órgãos da Administração Pública, de modo que a competência está devidamente observada (iniciativa privativa do Prefeito).
Válido, ainda, trazer ao debate a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADI 2.857), que “à luz do princípio da simetria, são de iniciativa do chefe do Poder Executivo estadual, as Leis que versem sobre a organização administrativa do Estado, podendo a questão referente à organização e funcionamento da administração estadual, quando não importar aumento de despesa, ser regulamentada por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo (art. 61, §1º, II, e art. 84, VI da Constituição Federal)”.
Destarte, é inequívoco que o Chefe do Poder Executivo detém a prerrogativa de extinguir os cargos públicos, na forma da lei, conforme prevê o art. 83, XIII da Lei Orgânica do Município: XIII – Promover e extinguir os cargos públicos municipais, na forma da lei, e expedir os demais atos referentes à situação funcional dos servidores; Por corolário, concluímos, que o Prefeito pode extinguir funções ou cargos públicos por meio de Decreto, desde que os mesmos estejam vagos, o que não parece ser a hipótese debatida no âmbito da municipalidade, dado que fixa, no mesmo projeto de lei, a pretensão de “transformação” dos mesmos.
b) Desse modo, é inconstitucional o Projeto de Lei Municipal que visa extinguir funções e cargos públicos que não estejam vagos, e, em decorrência da extinção realizar o reaproveitamento de servidores em função ou cargo público com nível de escolaridade superior ao cargo extinto;
Ao Chefe do Poder Executivo, mediante Projeto de Lei de sua iniciativa, quando os cargos e/ou funções que pretende ver extintos estão ocupados, é a de estabelecer a sua situação de “em extinção”, ou seja, tornam-se extintos a partir de sua vacância pelos titulares que hoje estejam no exercício dos mesmos (v.g. aposentadoria, exoneração ou morte), procedimento este, cite-se como exemplo, o adotado por esta Corte de Contas relativamente a seu novo PCCR (Lei Estadual n.º 9.493/2021), que colocou em extinção o cargo de Auxiliar de Controle Externo, assegurando-se a manutenção dos atuais servidores na ativa, até o rompimento do vínculo funcional.
Nesse sentido, por analogia ao procedimento adotado por este TCM/PA, fez-se fixar, a partir da vacância e extinção, portanto, dos cargos, a abertura de novas vagas para cargos de hierarquia superior, in casu, Auditor de Controle Externo, que somente serão providos a partir de novo concurso público, na forma legal e constitucional.
No que concerne ao “aproveitamento” de servidor, após extinção ou declaração de desnecessidade do cargo de origem, em função ou cargo público com nível de escolaridade superior ao cargo extinto, temos que o art. 44 da Lei Municipal nº 418/16 de Bom Jesus do Tocantins, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos Municipais da Administração Direta, suas Autarquias e Fundações Públicas, estabelece que o aproveitamento de servidor, após extinção ou declaração de desnecessidade do cargo de origem, far-se-á mediante aproveitamento obrigatório em cargo de atribuições e vencimentos compatíveis com o anteriormente ocupado: Art. 44.
O retorno à atividade, de servidor em disponibilidade, far-se-á mediante aproveitamento obrigatório em cargo de atribuições e vencimentos compatíveis com o anteriormente ocupado. O artigo do RJU supracitado, reproduziu o art. 30 da Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das autarquias e
das fundações públicas federais, que determina que: Art. 30. O retorno à atividade, de servidor em disponibilidade, far-se-á mediante aproveitamento obrigatório em cargo de atribuições e vencimentos compatíveis com o anteriormente ocupado.
Em análise aos dispositivos transcritos, temos que a disponibilidade abarca circunstâncias alheias à vontade do servidor, como extinção de órgão ou entidade, extinção de cargo, ou declaração de sua desnecessidade. Isto é, o servidor deverá ser aproveitado em cargo com atribuições, vencimentos, nível de escolaridade e especialidade compatíveis com o anteriormente ocupado, mesmo que o cargo não exista no órgão ou entidade de destino.
Neste diapasão, o art. 5º do Decreto nº 3.151/99, que disciplina a prática dos atos de extinção e de declaração de desnecessidade de cargos públicos, bem assim a dos atos de colocação em disponibilidade remunerada e de aproveitamento de servidores públicos em decorrência da extinção ou da reorganização de órgãos ou entidades da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, elenca que: Art. 5º. Extinto o cargo ou declarada sua desnecessidade, o servidor estável nele investido será imediatamente posto em disponibilidade, com remuneração proporcional ao respectivo tempo de serviço.
Outrossim, a equivalência salarial e de carga horária entre os cargos de auxiliar de enfermagem e técnico de enfermagem; auxiliar em higiene bucal e técnico em saúde bucal não é suficiente para o aproveitamento dos servidores, visto que a conclusão de outro nível de escolaridade, que seja superior, não altera a divergência entre as atribuições dos cargos.
Destarte, em análise dos dispositivos acima, descortinamos que também não há qualquer compatibilidade entre as atribuições dos cargos acima referidos. Assim, entendo ser ilícito o aproveitamento dos servidores titulares de cargo efetivo de auxiliar de enfermagem no cargo de técnico de enfermagem e, equitativamente, ilícito o aproveitamento dos servidores titulares de cargo efetivo de auxiliar de higiene bucal no cargo de técnico de saúde bucal.
Diante de todo o exposto, conclui-se que o aproveitamento de servidores públicos em cargos com atribuições distintas daquelas do cargo de origem, caracteriza vício de legalidade, por violação ao disposto no art. 44 da Lei Municipal nº 418/16 c/c art. 30 da Lei Federal nº 8.112/90, pela ausência de autorização legal para aproveitamento de servidores públicos em cargos com atribuições diversas daquelas do cargo de origem.